sexta-feira, 8 de janeiro de 2016
Morte de liderança rural no Maranhão revela falha sistêmica do Estado brasileiro, afirma a Anistia Internacional
Antônio Isídio Pereira da
Silva, liderança rural da comunidade de Vergel, no Maranhão, foi encontrado
morto no dia 24 de dezembro. Ele estava desaparecido desde o dia 20 deste mês.
Um dia antes de seu
desaparecimento, Antônio Isídio havia dito que iria denunciar o forte
desmatamento na área. Vergel, a 50Km da cidade de Codó, no interior do
Maranhão, é uma comunidade de pequenos agricultores e produtores rurais que
enfrentam a pressão constante de “grileiros” e madeireiros que querem
expulsá-los de suas terras. Antônio Isídio era uma das lideranças comunitárias
que vinham denunciando a ação de madeireiros e grileiros nos últimos anos na
região, sofrendo ameaças de morte e intimidações por conta disso.
“O assassinato de Antônio
Isídio é revoltante. Foi uma tragédia anunciada. Nos últimos três anos
denunciamos diversas vezes as ameaças sofridas por ele e a violência decorrente
de conflitos agrários na região de Codó, no Maranhão. E as autoridades – em
todos os níveis – não tomaram nenhuma medida para garantir a segurança dessas
pessoas. O preço da inação do estado, como em tantos outros casos, foi a morte
anunciada de Antônio Isídio. Isso é inadmissível”, afirmou Atila Roque, diretor
executivo da Anistia Internacional no Brasil.
Assim como muitos casos de
assassinatos de lideranças rurais mortas em consequência do conflito por terras
e recursos naturais, este caso corre o risco de permanecer impune. Não houve
instauração de inquérito policial sobre o caso e a morte de Antônio Isídio não
está sendo investigada. O registro de óbito não foi feito e não foi
realizada qualquer perícia sobre o corpo, que foi enterrado em uma “cova rasa”
envolto em uma rede e um saco plástico.
“Não podemos deixar que este
caso fique impune. A não responsabilização dos casos de assassinatos de
lideranças rurais alimenta o ciclo de violência no campo. As autoridades do
estado do Maranhão devem garantir uma investigação imediata do caso. O Maranhão
é um dos estados que apresenta maior número de pessoas mortas em decorrência de
conflitos no campo e quase nunca há justiça para as lideranças assassinadas”,
afirmou Roque.
Em parceria com a Comissão
Pastoral da Terra no Maranhão, a Anistia Internacional acompanha este caso há
cerca de três anos. Em 2013, a Anistia Internacional já havia denunciado as
ameaças sistemáticas que Antônio Isídio e outras famílias da comunidade de
Vergel vinham sofrendo. Em dezembro de 2012, um homem armado fez disparos perto
da casa de Antônio Isídio matando os animais. Em Janeiro de 2013, a capela
local foi queimada, impedindo que a comunidade fizesse as homenagens ao líder
comunitário Raimundo Pereira da Silva, que foi assassinado em 2010. Desde
então, várias ameaças de morte foram feitas à Antônio Isídio e à comunidade de
Vergel.
O Programa Nacional de
Proteção a Defensores de Direitos Humanos chegou a visitar a comunidade de
Vergel em 2013 e a entrevistar Antônio Isídio. No entanto, nenhuma medida foi
adotada para garantir a sua segurança.
As ameaças, ataques e
assassinatos de trabalhadores rurais e lideranças comunitárias no campo é
consequência do histórico conflito por terra e recursos naturais que assola o
estado do Maranhão. À medida que a fronteira agrícola avançou para o interior,
povos indígenas, quilombolas e comunidades rurais de pequenos agricultores no
estado ficaram sob pressão crescente de grileiros de terra, fazendeiros e
madeireiros ilegais. O conflito violento tem sido endêmico na região por muitos
anos.
O assassinato de Antônio
Isídio revela uma falha sistêmica das autoridades no enfrentamento dos
conflitos no campo e na garantia de proteção às comunidades rurais e
quilombolas no país. Apenas em 2014, 36 pessoas foram assassinadas em
decorrência de conflitos no campo, segundo os dados da Comissão Pastoral da
Terra.
A Anistia Internacional reitera sua demanda às
autoridades estaduais e federais para que garantam uma investigação adequada da
morte de Antônio Isídio Pereira da Silva, garantam a proteção imediata de seus
familiares e da comunidade de Vergel e adotem medidas de longo prazo para
acabar com a grilagem de terras, a extração ilegal de madeira e a violência
decorrente dos conflitos agrários na região de Codó.